O Relacionamento Social em tempo de pandemia

13-03-2020

A epidemia do coronavírus, além das óbvias consequências na saúde pública, obriga à adaptação dos hábitos sociais instituídos para evitar a sua propagação.

As formas de cumprimento social, seja ele mais ou menos formal ou familiar, são as primeiras manifestações sociais que, pelos motivos óbvios, se devem observar e acautelar e adaptarem-se a uma realidade extraordinária que não se compadece com a elegância e a cerimónia. Mas, como proferido por Aristóteles (384-322, a.E.C..) o Ser Humano é um "animal social por natureza", porque naturalmente carente, que necessita de coisas e de outras pessoas para alcançar a sua plenitude. As suas interacções são a expressão cultural e social perante o grupo e o meio onde está inserido, fundadas em séculos de tradição e história.

"a cidade é uma criação natural, e que o homem é por natureza uma animal social, e que é por natureza e não por mero acidente, não fizesse parte de cidade alguma, seria desprezível ou estaria acima da humanidade [...] Agora é evidente que o homem, muito mais que a abelha ou outro animal gregário, é um animal social. Como costumamos dizer, a natureza não faz nada sem um propósito, e o homem é o único entre os animais que tem o dom da fala. Na verdade, a simples voz pode indicar a dor e o prazer, os outros animais a possuem (sua natureza foi desenvolvida somente até o ponto de ter sensações do que é doloroso ou agradável e externá-las entre si), mas a fala tem a finalidade de indicar o conveniente e o nocivo, e portanto também o justo e o injusto; a característica especifica do homem em comparação com os outros animais é que somente ele tem o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto e de outras qualidades morais, e é a comunidade de seres com tal sentimento que constitui a família e a cidade." (Aristóteles, Política, I, 1253b, 15)

As diversas "societas" adoptaram os seus comportamentos de cortesia de acordo com as suas culturas, religiões e, mesmo, as condições climáticas.

As Culturas Ocidentais ostentam gestos de sociabilização com um registo de maior proximidade, onde o toque físico, como o apaerto de mão e o beijo no rosto, são a sua maior expressão. Em alguns países ocidentais, em ambos os hemisférios, vão mais longe ao abraçarem-se mutuamente em sinal de grande fraternidade e alegria. Na Gronelândia, o "kunik" é usado pelos esquimós e é aquilo a que os ocidentais chamam de 'beijo à esquimó'. Nas Filipinas, como sinal de respeito, os jovens Filipinos cumprimentam os mais velhos segurando a sua mão direita, curvando-se suavemente para a frente e encostando os dedos do idoso na testa, pronunciando "mano po". Na Índia, a famosa expressão 'namaste' é cumprimento comum entre hindus e habitantes de outros países do sudoeste asiático, feito à chegada e partida de alguém. Na Mongólia, para um cumprimento mais formal, os Mongóis sobem as mangas. Depois, a pessoa mais nova deve segurar os braços da mais velha abaixo do cotovelo, havendo depois uma troca de palavras. Por vezes, antes disto, há a oferta de um lenço para boa sorte, chamado de "khatag". Este deve ser dobrado a toda a largura e segurado pelas pontas, com os braços abertos, enquanto os dois se cumprimentam. Depois o lenço é oferecido em sinal de respeito. No Tibete, mostrar a língua é sinal de respeito e mesmo os monges o fazem. Também é comum colocarem as palmas das mãos para baixo, em frente ao peito. Na Nova Zelândia, na cultura Maori, o cumprimento mais tradicional é chamado de "hongi" e é muitas vezes acompanhado de um aperto de mão. Consiste em pressionar o nariz e a testa, ao mesmo tempo, contra o nariz e testa da outra pessoa. Depois deste cumprimento, o visitante passa de "manuhiri" (visita) para "tangata whenua" (local).

Actualmente, em Portugal, os cumprimentos entre pessoas, dependendo do seu estatuto social, profissional ou da idade, apresentam sinais de maior proximidade entre si, como o uso do beijo na face. Tal gesto, há algumas décadas atrás, seria impensável devido às convenções sociais existentes.

As senhoras davam a mão para um leve aperto de mão ou para o elegante beija-mão. Já os homens saudavam-se, sujeitos ao grau de familiaridade ou cerimónia com o interlocutor, com um vigoroso aperto de mão ou descobrindo a cabeça, tirando ou levantando o chapéu, então em voga, ou, simplesmente, levando os dedos à aba do mesmo.

Portanto, tal como outros hábitos sociais, também, os cumprimentos podem ser utilizados de acordo com as normas da saúde pública, em caso de epidemia. Não recorrendo às manifestações de cortesia de contacto directo, as pessoas podem saudar-se com um aceno de cabeça, ou uma leve reclinação do tronco, no caso dos homens.

Naturalmente, a utilização de fantasias, como as demonstradas pelo presidente dos Estados Unidos da América, quando cumprimentou alguém tocando os pés, são, além, de ridículos, falhos de significado.

João Micael

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